segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Lisboa e o Fim da Guerra Fria


Muita tinta tem corrido na imprensa portuguesa graças ao aparato que a Cimeira da NATO trouxe a Lisboa. Contudo, caros colegas e caros leitores, devo confessar que muito me entristece a superficialidade e a externalidade com que os nossos media têm abordado os acontecimentos dos passados dias 19 e 20. Parece-me que o interesse pela blindagem dos carros, pelo ginásio no avião do Sr. Obama ou pela inconveniente tolerância de ponto tem prevalecido sobre a importância histórica que esta Cimeira representa.
Lisboa tornou-se o palco de um novo ciclo de relações NATO-Rússia e prova disso é a aprovação do Novo Conceito Estratégico, onde a Rússia deixa de se constituir como o inimigo tradicional da Aliança Atlântica. A envolvência de Moscovo em questões tão importantes como a criação do escudo antimíssil é mais um sinal de reset nas relações entre os antigos rivais da Guerra Fria e vai de encontro aos esforços desenvolvidos pelo Presidente Barack Obama, responsável pela negociação do Tratado de Redução de Armas Estratégicas (START) com a Rússia.
Mesmo após a queda do Muro de Berlim e posterior desagregação das repúblicas soviéticas, a frieza e desconfiança nunca abandonaram as relações Washington-Moscovo. Em Lisboa, as duas potências parecem ter percebido que a ausência de diálogo e compromisso entre ambos poria em causa a eficácia do combate às ameaças da Nova Ordem Mundial, nomeadamente a luta contra o terrorismo pan-islâmico e a proliferação das armas de destruição maciça. O 11 de Setembro e a insegurança globalizada assinalaram uma oportunidade para a reinvenção da NATO e permitem agora que a organização se adapte aos novos desafios e circunstâncias do século XXI.
A escolha da ocidental praia lusitana como berço do Novo Conceito Estratégico é mais do que deliberada: em 1952, o Conselho do Atlântico Norte reuniu-se pela primeira vez em Lisboa, onde a coligação fundou a sua estrutura militar permanente e adquiriu credibilidade para poder impor a sua vitória pacífica na Guerra Fria, e, com o Tratado de Lisboa, a UE preparou-se para assumir novas responsabilidades na segurança internacional. Daí que o canto mais ocidental europeu assinale o impulso de uma pareceria estratégica EU-NATO cada vez mais próxima e empenhada.
Para contrariar o motto que tem vindo a cobrir os muros e as bocas da cidade de Lisboa, não há maior contradição do que esta junção de palavras “Paz Sim, NATO Não”; é a própria história que nos presenteia com 60 anos de paz e segurança que a NATO garantiu na Europa e que desembocou no processo de integração europeia.
O terrorismo, o cibercrime, as tiranias e a proliferação de armas de destruição maciça persistem como ameaças que estão em cima da mesa para os próximos anos e sentenciam os dilemas existenciais da Aliança Atlântica. Em Lisboa, a NATO revitalizou-se e vincou o seu novo papel na cena internacional e, sem abdicar da Rússia como uma das principais parecerias estratégicas, evidenciou que o mundo, definitivamente, deixou de ser bipolar.

23 comentários:

  1. Se me permites... "armas de destruição massiva" e não maciça. Destroem em massa e não maciçamente.

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  2. Cara Pindérica,

    Estamos sempre a aprender, mas a expressão correcta é maciça e não massiva.
    Se ainda estiveres em dúvida sugiro que consultes este (bom) corrector ortográfico e sintáctico :http://www.ciberduvidas.com/

    Cumprimentos,

    Joana Pereira

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  3. Joana,

    Penso que abordaste aqui vários pontos importantes.

    1- A importância de um momento de viragem, a concretização da nova reorganização geopolítica do pós Guerra Fria. Uma cooperação de defesa, que é também “defensiva” na sua planificação, no sentido em que acaba por ser um teste de aproximação mutua sem grandes riscos. Acho que a importância da ocasião ficou bem vincada para quem conseguiu fugir à maior parte das peças jornalísticas e ouvir os discursos, mas foi difícil.

    2- A NATO é uma organização armada que procura manter a paz. É sempre “tricky” afirmarmos taxativamente que a NATO contribui para a pacificação ou para a guerra. Evitaram-se graves conflitos a médio prazo com intervenções bélicas, em zonas que mesmo vivendo, em alguns casos, em clima de guerrilha permanente, não estavam em guerra. Acredito que o saldo da actuação destes mais de 50 anos é positivo, evitou-se mais sangue do que se criou, mas a questão é demasiado complexa para colocarmos à janela as tais faixas “Paz Sim, NATO não”, ou o contrário. Exige-se olhar para cada conflito individualmente. Vê isto como uma sugestão para um novo post se entenderes!!

    Cumprimentos,
    Pedro

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  4. Olá Pedro,

    Concordo com tudo o que disseste!
    Obrigada pelo comentário.

    Bjs,

    Joana

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. a pindérica tem razão, apesar da tua muito eloquente elucidação - "maciço" significa "sólido". compacto, não oco. conjuntos de montanhas. aproveitando que linkaste o ciberdúvidas, linko o priberam http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=maci%C3%A7o
    ou o freedictionary http://pt.thefreedictionary.com/maci%C3%A7o
    ou mesmo a wikipedia http://pt.wikipedia.org/wiki/Maci%C3%A7o

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  7. weapons of mass destruction

    mass=massas=massivo, e não maciço....

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  8. Não considero que um corrector ortográfico ou sintáctico substitua os conhecimentos e utilizações de conceitos pelos profissionais da área.
    Apesar de a palavra massivo ser uma adaptação do Inglês não deixa de ser mais correcta nesta situação. Sendo que a expressão utilizada pelo Exercito Português, forças armadas em geral, e IDN é massivo ou "em massa".

    O comentário anterior foi removido devido a um typo.

    Ana Garcia

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  9. Caras leitoras,

    Para acabar com as dúvidas, esclareço que venho da área de Relações Internacionais e por isso sinto-me na obrigação de dominar estes conceitos. Maciço é o vocábulo original da Língua Portuguesa, enquanto massivo é o neologismo (de massive), daí que tenha vindo a ser cada vez mais incorporado na linguagem de muitos jornalistas, e como a Pindérica referiu, até dos próprios militares. Contudo, sou fiel às origens da palavra e colo-me à versão dos especialistas das Relações Internacionais que mais admiro,e que empregam igualmente a expressão (mais) correcta : armas de destruição maciça.

    Deixo aqui uns textos para os últimos esclarecimentos:

    "
    Deverá dizer-se sempre «armas de destruição maciça», e não “massiva”.

    O termo português correspondente ao francês massif e ao inglês massive é, sempre foi — registado nos mais diversos dicionários de há séculos —, maciço, que significa «compacto», «sólido», «robusto», «qualidade de quantidade de coisas muito chegadas, muito apertadas», «basto», «cerrado», «qualidade daquilo que existe em grande quantidade».

    Quando se começou a falar de armas de destruição que têm um terrível efeito devastador (nucleares ou químicas, por exemplo), aplicou-se a essa destruição o adjectivo maciça: «destruição maciça» («cerrada, densa, que atinge tudo, inclusivamente grandes massas de pessoas»). Como em inglês maciça se diz massive e em francês também massive (feminino de massif), em português recentemente começou a ouvir-se o termo "massiva", tradução literal de uma palavra estrangeira cuja correspondência já existia em português, ou seja, uma palavra desnecessária.

    Maciça é a forma feminina de maciço, adje(c)tivo de origem castelhana (“macizo”), que significa compacto, sólido, etc. Em Português significa ainda grande quantidade de alguma coisa, grosseiro, pesado, etc. Daqui se conclui que se justifica a expressão armas de destruição maciça. “Massiva” é a forma feminina do adjectivo “massivo” que constitui um neologismo na Língua Portuguesa. “Massiva” e “massivo” provêm do vocábulo inglês “massive”, que, por sua vez, tem origem nas palavras francesas “massif” e “massive”. Foi uma criação da língua francesa tendo por base a forma latina ‘massa’. Os franceses usam a expressão “bombardement massif”. A origem latina e neolatina da palavra “massivo” e “massiva” ajudaram à rápida entrada na Língua Portuguesa. Aqui no Ciberdúvidas temos várias respostas condenando este neologismo, uma vez que quer significar exa(c)tamente o mesmo que maciço. Pessoalmente, acho-o um neologismo aceitável.
    Pelas razões apresentadas, também a expressão armas de destruição em massa é perfeitamente clara e está de acordo com a evolução semântica da palavra latina ‘massa'.
    "

    Espero ter esclarecido as vossas dúvidas. Armas de destruição massiva não é de todo uma expressão incorrecta, mas se quiserem escrever "em bom português" prefiram a expressão "armas de destruição maciça".

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  10. Penso que nesse caso e depois de ler a opinião de todos a palavra evoluiu de um termo menos apropriado, mas que era o utilizado em Português, para algo que se adequa mais ao contexto (massivo), porque de facto e como todos disseram, destrói massas... E tem sido o termo utilizado pelos especialistas na área das RI e até militares como referiu a Pindérica.

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  11. Passo por aqui para dar os parabéns à Joana Pereira pelo excelente texto que desenvolveu e pela resposta atempada aos comentáarios. Gabo-lhe ainda a humildade que imprime no que escreve, sendo inquestionável o seu mérito académico e profissional. Não precisa a Joana, portanto, de qualquer defesa a este respeito, podendo-se remeter esse assunto para o ano lectivo de 2008/2009 onde o reconhecimento foi público e feito ao nível institucional.

    O Pedro Correia já tinha tocado em dois pontos importantes, quanto a mim, interesserá reter com especial atenção o segundo desses pontos. Julgo que se a Europa está desde a Segunda Guerra Mundial em relativa paz, muito pode agradecer à Nato e ao quadro institucional que foi criado no pós II Grande Guerra.

    Parece-me pouco importante discutir termos técnicos. Parece-me ainda menos importante discutir eventuais erros linguisticos (que não parece ter sido o caso). Muitas pessoas utilizam Massivo outras utilizam Maciço. Seria bem mais interessante um comentário sobre o conteúdo. Se todas são estudantes de Relações Internacionais, certamente que podem dar um útil contributo a este debate, referindo-se ao conteúdo e não à forma do texto. Seria muito interessante, pelo menos na minha perspectiva de espectador atento mas não entendido na matéria, ler vários pontos de vista sobre o que aqui foi dito.

    Queria igualmente agradecer os comentários de todos. O sucesso ou insucesso de um blogue (mais a mais de um blogue com os propósitos do Zona de Decisão)depende imenso do debate feito nas caixas de comentários. É por aí que temos a verdadeira percepção da amplitude e da profundidade do debate de ideias que conseguimos (ou não conseguimos) gerar.

    Espero que a vossa visita seja assídua.

    E deixo-vos, já agora um desafio:

    Ana Rita Garcia, qual é a tua opinião sobre o novo conceito estratégico saído da Cimeira de Lisboa?

    Bárbara, achas possível a integração da Rússia na Nato, no período de uma década?

    Inês, na tua opinião a Nato deve servir apenas como uma organização de defesa dos países que nela estão integrados, ou, pelo contrário, deverá servir para Missões fora do espaço NATO, como foi o caso do Afeganistão? E se sim, em que medida?

    Contribuam! O Blogue é feito a pensar nos seus leitores.

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  12. Rebeca quando comentei não tinha visto o teu comentário. Deixo-te também uma pergunta:

    Quais são as vantagens práticas da colaboração Russia na protecção anti-missil na Europa?

    P.S - Admito o egoísmo nas perguntas que fiz. Relações Internacionais e políticas de segurança internacional não são, de todo, a minha especialidade. Perante tão ilustre audiência, tenho aqui uma boa oportunidade de aprender um pouco mais com as caras leitoras. Por outro lado, julgo que o debate que proponho serve também o interesse da generalidade dos leitores que nos seguem.

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  13. Talvez. A NATO já tem como Estados-membro alguns dos países do antigo Pacto de Varsóvia, e a Rússia faz parte do Partnership for Peace.

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  14. Mas não terão os países da Ex-URSS entrado na Nato também como forma de, definitivamente, fugirem à velha ameaça Russa?

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  15. bem, a estónia, letónia e lituânia já há muito que se via que lhe queriam fugir.

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  16. Tiago, quer aprender ou testar-nos?
    O meu comentário não foi de todo uma crítica, aliás, conheço a Joana e ela certamente se lembra quem é a Rebeca, portanto não vim cobardemente atacá-la (ou atacá-la sequer). Mais triste acho a sua intervenção que nada veio aqui acrescentar senão infantilidade ao tentar "testar-nos de forma bacoca".

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  17. Cara Rebeca,

    Podes me tratar por tu. Afinal até julgo que já fomos apresentados pessoalmente, numa festa da Portela, no Verão de 2009. Estavas, precisamente, com a Ana Rita Garcia e uma outra pessoa. Julgo que eras tu. Senão eras, podes tratar por tu na mesma :)

    Quanto à tua tristeza, lamento mas nada posso fazer. Efectivamente queria mesmo aprender mais. As perguntas que fiz são do mais básico que existe, o que prova que sou um leigo na matéria. Se o objectivo fosse testar, perderia 15 minutos a fazer uma pesquisa num manual de Direito Internacional Público e colocaria questões mais direccionadas e que vos obrigassem a dar uma resposta mais elaborada. Queria apenas trocar opiniões com pessoas entendidas na matéria. Opiniões, já que deduzo que não exista nenhum conceito técnico que me responda sobre se a Rússia estará na Nato daqui a 10 anos ou não, por exemplo.

    Da mesma maneira, se fosse um post sobre Economia, perguntaria ao Pedro a opinião dele, sobre a Flat Tax, por exemplo.

    Última nota: Quando dizes que não vieste cobardemente atacar a Joana, ad contrariu sensu, estás a afirmar que outros o fizeram. E não foi esse o entendimento. Acho que foi uma salutar troca de opiniões, que ninguem veio atacar ninguém. Afinal, já todos temos mais de 15 anos... :)

    Agradeço o teu comentário e espero que sejas visita assídua.

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  18. Aproveitando para centrar o debate, qual é o vosso posicionamento sobre as manifestações contra a Nato? Era interessante um comentário sobre o ponto 2 do comentário do Pedro Correia, não obstante essa matéria poder ser objecto de tratamento pela Joana Pereira, em post mais detalhado.

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  19. Este comentário foi removido pelo autor.

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  20. "College is just high-school with more expensive books". Não me digas que só por crescemos deixam de haver duplos sentidos ou insinuações (sim, foi o que fizesTe), pelo contrário, as técnicas apuram-se e tornam-se cada vez mais subtis. Aliás, ao negares que a tua atitude foi de contra-ataque e utilizares falsas cordialidades estás a usar a técnica da ''chapada de luva branca''.

    E não, não costumo ler o blog, apenas soube que andava aqui um debate sobre uso (que pode ser considerado inadequado) de certas expressões, fora isso, não nego o mérito que referiste da Joana, até testemunhei pessoalmente e variadas vezes o seu "reconhecimento público e feito ao nível institucional".

    E por último, em muitas áreas necessitas de "conhecimentos técnicos" para dar a tua opinião, caso contrário não passa da famosa conversa de café; e acho que se queres aprender, pouco conseguirás com conversa de café e eu pouca paciência tenho para partilhar opiniões com demagogos.

    ("Última nota" - Eu não afirmei nada, apenas neguei te-lo feito. E a sério... Queres mesmo debater isso? Cuidado com as teorias da conspiração que podem surgir se começares a raciocinar muito segundo o "ad contrariu sensu".)

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  21. Peço então desculpa pela minha atitude de tentar que o efeito útil do post pudesse ser retomado discutindo-se aspectos que directa ou indirectamente resultaram da Cimeira. A minha tentativa passava por recentrar o debate e tentei com isso envolver todas as pessoas que aqui comentaram.

    De todo o modo, não é preciso utiizares um registo ofensivo e ameaçador para expressares as tuas posições. Registei a tua pouca paciência, a habilidade para fazeres juizos de valor sobre os comentários das pessoas e o nível de maturidade da contribuição que vieste prestar a este debate. Agradeco-te, ainda assim este teu comentário, pedindo-te a ti e aos restantes leitores para que, a bem do debate de ideias, se centrem no assunto do post da Joana.

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  22. Ofensivo e ameaçador ou directo e sem insinuações? Há dois lados da moeda. Encara como quiseres. A tua opinião sobre a minha paciência, juízos de valor ou maturidade = zero.

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  23. Obrigado pela visita a pelos comentários enriquecedores. Volta sempre!

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